José Noce em… é pro Fantástico?


Esse cara tem hisória

por Filipe Lutalo

O RPGames Brasil tem a honra de trazer um grande parceiro, amigo, jogador de RPG, desenvolvedor de jogos e blogueiro do Macunaíma Games, José Noce. O cara já desenvolveu dois jogos, lançou livro e está desenvolvendo seu primeiro RPG para crianças. 

RPGames Brasil: Seja bem-vindo, José! Nos fale um pouquinho de você? 

José Noce: Olá Filipe e demais irmãos e irmãs de armas da RPGames Brasil! Como já foi dito, sou o game designer por trás do studio Macunaíma Games. Além de jogos e acessórios, como miniaturas e grids, meu trabalho foca na criação de “ferramentas narrativas”. Mais do que fazer jogos que eu gostaria de jogar, crio em cima de demandas. Dessa forma, resolvo problemas que ainda não foram abordados, ou ofereço uma nova perspectiva sobre os mesmos. 

R.B.: A quanto tempo joga RPG e como começou a jogar? 

J.N.: Jogo desde 1995; já se vão 25 anos de vício. Eu tinha lido algo sobre RPG numa matéria da Super Interessante, que mostrava imagens maravilhosas, mas não explicava muito sobre o jogo. Até o dia que fui convidado pra jogar Dragon Quest na casa de um grande amigo, o Leandro. Ele narrou pra mim e pro meu irmão. Foi paixão à primeira vista com o RPG! Por azar, o Leandro devolveu o Dragon Quest pro dono. Não concluimos a mini campanha que vinha no jogo. 

Meses depois, vi um d10 e um d20 no estojo de canetas de um colega. Ai, pirei! Queria saber se eu podia jogar com ele, aonde eu comprava os dados. Fui apresentado a dois dos principais points RPGísticos da época aqui em BH: a saudosa sede da Livraria Leitura na Avenida Cristóvão Colombo e a que ficava ao lado do Edifício Dantes, no Centro. E o resto é história...

R.B.: Quais os sistemas e cenários que mais curte jogar? O que tem jogado? 

J.N.: Passei pelo Mundo das Trevas, GURPS e do Shadowrun, entre vários outros. Agora abracei – acredito que de vez – o movimento Old School Renaissance (OSR ). Hoje em dia sou um narrador e jogador de one shots em eventos, pois não dou mais conta de acompanhar campanhas. É a idade, fazer o que? (risos) 

Tenho narrado muito o meu RPG infantil Pequenos Aventureiros, pois sou um pai coruja (risos). Além dele, costumo jogar novos produtos, especialmente, de autores independentes. Deuses da Aventura, o Futuro Sombrio, Espadas Afiadas & Feitiços Sinistros e o Solar Blades & Cosmic Spells, O Mundo das Fadas, DC&G. Dos jogos gringos, um que eu amo é o Maze Rats e The Black Hack. 

R.B.: Qual a campanha ou aventura de RPG foi mais memorável para você? 

J.N.: Teve duas. Durante a greve do CEFET-MG de 1998 – sou velho (risos). De segunda a segunda, tava lá eu no comando de greve ou narrando RPG. Foi o grupo mais foda de Vampiro que de toda a minha vida! Ia narrando em reação às ações dos personagens, na minha maior perfomance sandbox. O grupo se dividia em clãs, fazendo reuniões à parte dos demais. Outro dia, encontrei com alguns jogadores que também se lembram dessa campanha, de tão memorável. 

A outra, foi a sucessão de campanhas que você narrou de GURPS Banestorm. No CEFET, desenvolvi o improviso, com você observei a importância de elementos narrativos que dão substância pra história, como o controle do tom do jogo, a dinâmica e verossimilhança da trama. Tive a oportunidade de evoluir minha “mestragem” (risos). E foi lá, no comecinho dessa campanha que durou bons anos, que acabei enterrando um aliado orc com o “Santo Sudário”. (risos) 


R.B.: Todo mestre de RPG é um desenvolvedor de jogos. Você começou a desenvolver board games. Por que foi para esse ramo? 

J.N.: Desde pequeno, sempre gostei de criar jogos, de uma forma ampla. Era inspirado por matérias que vinham na Super Interessante. Então, estava sempre tentando fazer uma variante desse ou daquele jogo, ou criando os meus próprios, tentando criar alguma mecânica nova. Sempre prevaleceu em mim uma paixão pela criação. 

R.B.: Nos fale do Pirâmide de Poder e do Golpe de Estado? 

J.N.: A Pirâmide do Poder é um jogo de tabuleiro com mecânica simples que pode ser jogado em poucos minutos. Cada jogador controla um ou mais Mestres da Conspiração Invisível. Eles mandam no mundo, mas cada um deles possui uma visão diferente. Assim, buscam alcançar a Grande Verdade, para que seu ponto de vista suplante os demais e possam impor a sua forma de “sociedade perfeita”. Fiz esse jogo pra mostrar o quão anedótica é essa ideia de Illuminati e outros supostos grupos conspiratórios que dominam as nossas vidas sem que percebamos. Tanto que um dos personagens que escolhi inserir no jogo é o Cérebro, de O Pinky e o Cérebro. 

O Golpe de Estado é um jogo de tabuleiro de complexidade mediana. Fala de algo que deveria ser encarado de forma mais séria e criteriosa pelas pessoas, a política. O jogo se propõe a fazer isso, recorrendo a um humor bem ácido. Cada jogador comanda um grupo subversivo que almeja suplantar um estado corrupto e decadente para tomar o poder. Não digo que estado é esse, mas as cartas são separadas em verdes, amarelas, azuis e brancas. Ou seja, estamos falando da Holanda (risos). Cheguei a criar quatro expansões. Elites, Greve Geral e Poder Paralelo falam das relações desses grupos subversivos com as classes da nossa sociedade: capitalistas, operários e o submundo. Enquanto, Contatos Especiais oferece um recurso mecânico, com cartas de maior valor dentro do jogo. Se bem que, atualmente, o certo seria juntar Elites e Poder Paralelo numa única expansão (risos) – tô rindo, mas de nervoso. 

R.B.: Como foi a concepção do Vamos Botar Ordem Nesta Bodega? Por que a galera do rpg deve lê-lo? 

J.N.: Sempre observei materiais voltados para narradores e quase todos eles partiam da mesma perspectiva: O que o mestre pode oferecer aos jogadores?, num ato legítimo de entrega. Muitas vezes, os esforços para entreter os jogadores não são valorizados. As matérias que eu escrevi aqui na RPGames Brasil, assim como os demais conteúdos que eu inclui no meu livro, buscam apresentar uma perspectiva que servisse de contraponto: Qual é o mínimo que o mestre tem direito de exigir dos jogadores? 

Meu livro tem uma abordagem “mestrocêntrica”, mas não é que o mestre deva impor sua vontade ao grupo. É um apanhado de dicas para ele fazer o seu trabalho valer a pena. Ele apresenta formas para escolher grupos com expectativas mais alinhadas às do mestre e como resolver conflitos com jogadores. Convido os mestres a experimentarem-nas... 

R.B.: Horizonte Indie, Gary’on, dois dos muitos eventos de jogos que você já trabalhou na organização. Quais as dificuldades e delícias de organizar um evento? 

J.N.: Organizar eventos surgiu por necessidade… Organizar eventos me demanda mais tempo do que tenho até para desenvolver meus jogos. Fui um dos fundadores do Movimento Horizonte Indie, coletivo que surgiu em BH e que tem como objetivo criar uma rede de apoio mútuo entre autores independentes, pequenas editoras e lojistas. 


R.B.: Como surgiu a ideia de criar o Pequenos Aventureiros e mestrar para crianças? 

J.N.: Criança é empolgada, além de não precisarem se preocupar com contas a pagar, fazer hora extra no serviço, etc. Resolvi usar o Kids & Dragons ao começar a montar o grupo. Os mais novos também demonstraram interesse. Não seria legal dizer pra eles: “esse jogo não é para vocês, pois ainda não sabem ler...”. Seria não só um banho de água fria. Daí, me veio a ideia de elaborar um jogo que quebrasse a barreira da alfabetização, permitindo que crianças muito novas também pudessem ser apresentadas ao RPG. E daí em diante, dá-lhe playtest! 

R.B.: Quais estão sendo suas fontes de pesquisa ou referência para esse trabalho tão inovador? 

J.N.: Há pouco material RPGístico voltado para o público infantil no Brasil. Então muita coisa a gente acaba aprendendo na tentativa e erro, ou então na troca de experiência com outros narradores. Cito o Kids & Dragons, o Hero Kids e o Maze Rats, no qual me inspirei pra criar a mecânica de criação de aventuras. Jogar Pequenos Aventureiros não requer que a criança saiba ler e escrever, mas narrar sim. 

Outra referência é The Art of Game Design: A Book of Lenses, que me ajudou a entender como crianças lidam com o lúdico de acordo com a faixa etária delas. Isso foi divisor de águas no meu trabalho, que definiu de forma mais clara alguns aspectos com os quais eu trabalharei dentro do jogo. 

R.B.: Qual a importância de narrar para crianças? 

J.N.: Sem medo de parecer piegas ou redundante, digo que as crianças são o futuro da humanidade. Então nada melhor do que cuidar do nosso próprio futuro, estimulando nossas crianças a desenvolverem o raciocínio, o bom senso, a aprenderem a trabalhar em equipe, entre outros benefícios advindos de se jogar RPG. 

R.B.: Qual a previsão para lançamento? 

J.N.: Se não rolarem imprevistos, até o fim do ano eu quero lançar um financiamento coletivo do Pequenos Aventureiros. O jogo em si já está praticamente escrito, mas quero adicionar algumas aventuras. No mais, é esperar os ilustradores entregarem as artes e partir pra diagramação. Quero ter o jogo pronto quando for lançar a campanha. Terá mecânicas novas, mais enxutas e resolutas, além de outras novidades que ficaram de fora da versão Fast Play. 

R.B.: Obrigado por dividir um pouquinho do seu maravilhoso trabalho conosco. Que mensagem final você deixa para nossos leitores? 

J.N.: Meu muito obrigado a você que conseguiu ler até o final, pois eu sei que eu falo pra caramba (risos)! Aproveite também pra ir lá conhecer o blog da Macunaíma Games e os vários jogos que temos disponíveis por lá pra download. Quem quiser se aprofundar um pouco mais sobre como narrar para crianças e adolescentes, recomendo o vídeo que eu fiz para a RPGCON e o podcast da Caquitas em que eu participei falando a respeito desse tema. Pra terminar, fique de olho nas novidades, pois desse mato ainda sai muito coelho!




2 comentários:

  1. Foi um grande prazer participar desta entrevista Filipe! Mto obrigado pelo espaço. Precisando estamos às ordens. Vlw e um grande abraço!

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